Louise Labé (1526-1566)
Uma intelectual e um "eu lírico feminino" em uma
harmoniosa articulação do Discurso Amoroso.
O Renascimento é uma época caracterizada por transições. Transição econômica e política (feudalismo – capitalismo), transição social (ruptura com as estruturas medievais) e transição artística (redescoberta e revalorização das referências da antiguidade clássica). Todas estas transições resultam em valores humanistas e naturalistas que levam em sua base conceitos associados ao Humanismo: o neoplatonismo, o antropocentrismo, o hedonismo, o racionalismo, o otimismo e o individualismo, cujo precursor é Petrarca.
Apesar de todas essas mudanças na sociedade e no pensamento da época, a mulher parecia estar em absoluto repouso intelectual e histórico; e continuava-se esperando que uma mulher fosse o objeto de mais alta virtude, que possuísse apenas dons naturais: bela e adorada, que se dedicasse às atividades cotidianas reduzidas ao casamento, em uma vida isolada e que, intelectualmente, somente desenvolvesse artes como tricô, tapeçaria, pintura e música. No entanto, nesse contexto aparece uma mulher que diz:
“Beijai-me agora, e muito, e outra vez mais,
Dai-me um de vossos beijos saborosos,
E depois, dai-me um desses amororos,
E eu pagarei com brasa o que me dais.
Com mais dez beijos longos, langorosos,
E assim, trocando afagos tão gostosos,
Gozemos um do outro, em calma e paz.
Eu viva em vós e vós vivendo em mim.
Deixai que vague, pois, meu pensamento:
Não dá prazer viver bem comportada;
Bem mais feliz me sinto, e contentada,
Quando cometo algum atrevimento”.
Louise Labé
Tradução: Sérgio Duarte