segunda-feira, 22 de dezembro de 2014

A Cigarra e a Formiga

“Depois de acumular barras e barras de ouro,
a formiga, afinal, sentiu o último alento,
pesarosa, talvez, como bom avarento,
de não poder levar consigo o seu tesouro.

–“A minha vida foi um trabalho incessante!
Trabalhei! Trabalhei sem parar um instante!”

Naquele mesmo dia, estranha coincidência,
exausta de cantar, a boêmia da cigarra.
o derradeiro adeus deu, cheia de eloquência,
à vida que levara, ao léu, sempre na farra.

– “Cantei! Cantei, alheia ao mais, despreocupada,
que a vida é só amor; o resto não é nada!”

E, juntas, para o céu elas foram subindo.
A cigarra cantava, estuante de alegria:
– “Mas que dia! E que sol! Como tudo está lindo!”
– “O meu ouro ficou…” a formiga gemia.

Foi recebê-las Deus: — “Responde-me cigarra;
o que fizeste lá? O que fizeste, narra.” .

– “Cantei. Sempre cantei, em meio à humana dor,
a alegria da vida, a alegria do amor”.

– “E tu?” — “Eu trabalhei. E tudo lá ficou…”
Depois de ouvi-las, Deus bondoso lhes falou:

–“O trabalho merece e a glória do Paraíso.
Mas tu, (disse esboçando esplêndido sorriso,

sob a fascinação do canto da cigarra)
se levaste, afinal, uma vida bizarra

alegraste, porém os corações aflitos
que sangravam de dor, dos humanos precitos”.

… E à flor dos lábios tendo seu melhor sorriso,
abriu para a cigarra as portas do Paraíso.

Afonso Louzada

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